TJPA 01/04/2022 - Pág. 475 - Diário da Justiça - Tribunal de Justiça do Estado do Pará
TJPA - DIÁRIO DA JUSTIÇA - Edição nº 7343/2022 - Sexta-feira, 1 de Abril de 2022
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Federal.
Assim, caracterizado o esbulho sofrido pela autora, inexistem dúvidas de que o pedido formulado na
inicial deve ser julgado procedente.
Por fim, ratifico, uma vez mais às partes, que a presente aç¿o é de cunho possessório, e como tal n¿o é o
domínio da coisa o fator a ser levado em conta para a decis¿o final do processo, mas sim o exercício de
posse agrária. Nesse sentido, a dominialidade pública do imóvel n¿o tem o cond¿o de prejudicar a análise
da lide possessória entre particulares. Ou seja, ainda que exista eventual discuss¿o acerca do domínio da
coisa, tal situaç¿o n¿o retira do autor a possibilidade de pleitear o reconhecimento de sua alegada posse
contra um particular, na medida em que a vedaç¿o legal de pleitear posse sobre bem público só se dá
quando o litigante é o próprio ente público proprietário do bem, o que n¿o se dá na situaç¿o em análise.
Esse é o entendimento do STJ:
RECURSO ESPECIAL. POSSE. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. BEM PÚBLICO
DOMINICAL. LITÍGIO ENTRE PARTICULARES. INTERDITO POSSESSÓRIO. POSSIBILIDADE.
FUNÇ¿O SOCIAL. OCORRÊNCIA.
1. Na ocupaç¿o de bem público, duas situaç¿es devem ter tratamentos distintos: i) aquela em que o
particular invade imóvel público e almeja proteç¿o possessória ou indenizaç¿o/retenç¿o em face do ente
estatal e ii) as contendas possessórias entre particulares no tocante a imóvel situado em terras
públicas.
2. A posse deve ser protegida como um fim em si mesma, exercendo o particular o poder fático sobre
a res e garantindo sua funç¿o social, sendo que o critério para aferir se há posse ou detenç¿o n¿o é o
estrutural e sim o funcional. É a afetaç¿o do bem a uma finalidade pública que dirá se pode ou
n¿o ser objeto de atos possessórias por um particular.
3. A jurisprudência do STJ é sedimentada no sentido de que o particular tem apenas detenç¿o em
relaç¿o ao Poder Público, n¿o se cogitando de proteç¿o possessória.
4. É possível o manejo de interditos possessórios em litígio entre particulares sobre bem público
dominical, pois entre ambos a disputa será relativa à posse.
5. À luz do texto constitucional e da inteligência do novo Código Civil, a funç¿o social é base normativa
para a soluç¿o dos conflitos atinentes à posse, dando-se efetividade ao bem comum, com escopo nos
princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana.
6. Nos bens do patrimônio disponível do Estado (dominicais), despojados de destinaç¿o
pública, permite-se a proteç¿o possessória pelos ocupantes da terra pública que venham a lhe dar
funç¿o social.
7. A ocupaç¿o por particular de um bem público abandonado/desafetado - isto é, sem destinaç¿o
ao uso público em geral ou a uma atividade administrativa -, confere justamente a funç¿o social
da qual o bem está carente em sua essência.
8. A exegese que reconhece a posse nos bens dominicais deve ser conciliada com a regra que
veda o reconhecimento da usucapi¿o nos bens públicos (STF, Súm 340; CF, arts. 183, § 3°; e 192;
CC, art. 102); um dos efeitos jurídicos da posse - a usucapi¿o ¿ será limitado, devendo ser
mantido, no entanto, a possibilidade de invocaç¿o dos interditos possessórios pelo particular.
9. Recurso especial n¿o provido. (GRIFEI) ¿ RESP nº 1296964/DF ¿ Rel. Min. Luis Felipe Salom¿o ¿
Julg. Em 18/10/2016 ¿ DJ de 07/12/2016).