TJBA 12/12/2022 - Pág. 622 - CADERNO 1 - ADMINISTRATIVO - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.232 - Disponibilização: segunda-feira, 12 de dezembro de 2022
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Narrou, ainda, a Agravante, que “o magistrado de primeiro grau deferiu o pedido liminar para reintegração de posse do beco ao
Agravante, como já exposto o Autor da ação NUNCA OCUPOU, SEQUER POR UM SEGUNDO, O BECO”.
Disse também que “é pertinente que em caso da não concessão do efeito suspensivo de nada adiantará o recebimento do recurso, considerando ser necessário a suspensão para que não ocorra a retirada do portão que guarnece o beco que compõe a
residência dos Agravantes”.
Ao final, pleiteou, “a) A CONCESSÃO PELO RELATOR DO EFEITO SUSPENSIVO, considerando a presença do periculum in
mora e o fumus boni iuris, para que suspenda os autos principais até o julgamento do presente recurso. b) Intimação da Agravada
para, querendo, apresentar resposta em 15 dias, conforme dispõe o art. 1.019, II do CPC. c) O CONHECIMENTO DO PRESENTE RECURSO E ACOLHIMENTO DOS PEDIDOS, COM CONSEQUÊNCIA REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA. d) Requer,
por fim, a dispensa de juntada dos documentos, nos termos do art. 1.017, § 5º do CPC”.
É o relatório. Passo a decidir.
Estão presentes os requisitos de admissibilidade do recurso, de modo que dele conheço, passando à apreciação do pleito liminar
formulado.
O art. 1.019, inciso I do CPC prevê que o relator “poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de
tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão”. Trata-se, no particular, de tutela provisória
de urgência no bojo do próprio recurso, que, na esteira do art. 300 do diploma processual civil, “será concedida quando houver
elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”, em semelhante
acepção ao quanto disposto no art. 995, parágrafo único da mesma lei codificada.
Destarte, a concessão da antecipação da tutela recursal depende da presença concomitante de dois requisitos: a relevância das
alegações, consubstanciada na probabilidade de provimento do recurso, e o perigo de lesão grave em decorrência da demora.
In casu, em juízo de cognição sumária do feito recursal, próprio do momento processual em que é apreciado, entende-se não
estarem presentes os requisitos autorizadores para a concessão da medida.
Trata-se de ação de reintegração de posse de um beco que separa a residência da parte autora e ré, que foi recentemente fechado com um portão de ferro e cadeado.
Da análise das fotografias juntadas por ambas as partes verifica-se que o beco foi fechado recentemente com uma grade de ferro
e cadeado. Fato este inclusive confessado pelo Sr. Luciano, convivente da parte acionada, em audiência, posto que afirma que
fechou o beco, a fim de impedir a passagem de animais, impedindo também a passagem do pedreiro que trabalhava na casa do
autor (ID 22213651).
Somado a isso, foi ouvido em audiência a testemunha denominada de Sr. Antônio Alves Gomes, trazida espontaneamente para
depor em audiência pela parte autora, que afirmou que sua mãe era proprietária da casa que hoje pertence a parte autora, e que
o beco era usado como área de serviço e como passagem, quando a casa era utilizada pela mãe dele, isto porque o beco fazia
parte da casa. Disse também Sr. Raimundo, que a casa vendida tem cinco metros de frente como está no documento de compra
e venda, sem incluir o beco, mas que várias casas da rua possuem um beco entre elas, e que a mãe dele usava o beco antes da
construção da outra casa, quando era um terreno baldio.
Também foi ouvido o depoimento da testemunha denominada Sr. Carlos Conceição Barbosa Filho, que trabalhou na casa de Sr.
Oscalito em 2021. Afirmou que o beco é um acesso ao quintal, área de serviço da casa do autor. Informou que, antes da reforma,
a casa tinha inclusive uma janela que dava para o beco. Disse ainda que, em certo dia, Sr. Luciano ficou incomodado com o
barulho da obra de reforma do imóvel, que o Sr. Luciano chegou a xingar o pastor autor, e arrancou a acerca que estava no local.
Respondendo a pergunta formulada pelo advogado do réu, disse que na reforma o Autor não fechou o beco, porque o beco serve
de acesso à área do fundo da casa.
Em análise superficial do feito percebe-se que não restou demonstrada a propriedade da área pela parte autora, entretanto pelos
depoimentos das testemunhas ouvidas em juízo se percebe que existia uma passagem pela propriedade do réu que era utilizada
pelo autor para chegar até o fundo da sua propriedade, que foi fechada com portão de ferro e cadeado.
Presentes os requisitos da passagem forçada, a princípio, indicados como fundamento para se reconhecer a servidão de passagem, utilizando-se da fungibilidade própria das ações possessórias, posto que sendo autor e réu vizinhos confinantes, necessária
a passagem pela propriedade do acionado para se chegar ao terreno que fica no fundo da propriedade do Autor de forma menos
gravosa, não restando demonstrado nos autos que existente um trajeto alternativo, capaz de permitir a passagem de animais
mais facilmente.
Esclarece o professor Flávio Tartuce in Manual de Direito Civil, pág. 1138, que “a respeito da efetivação da passagem forçada,
sofrerá o constrangimento o vizinho cujo imóvel mais natural e facilmente se prestar à passagem (art. 1.285, § 1º, do CC). Segue-se a ideia que já constava da codificação anterior, no sentido de que a passagem forçada deve ser instituída da maneira menos
gravosa ou onerosa aos prédios vizinhos (princípio da menor onerosidade). Se ocorrer alienação parcial do prédio serviente, de
modo que uma das partes perca o acesso à via pública, nascente ou porto, o proprietário da outra deve tolerar a passagem (art.
1.285, § 2º, do CC). A obrigação de tolerar a passagem forçada deve acompanhar a coisa, constituindo uma obrigação ambulatória ou propter rem. A regra de tolerância nos casos de alienação deve ser aplicada ainda quando, antes da alienação, existia passagem através de imóvel vizinho, não estando o proprietário deste constrangido, depois, a dar uma outra (art. 1.285, § 3º, do )”.
Na hipótese, se quer resguardar o direito de acesso do Autor pela pequena passagem (beco) que passa pela propriedade do
réu, o que não o obriga a tirar a porta de ferro, a cerca ou cadeado, podendo o mesmo disponibilizar, por exemplo, uma cópia da
chave que abre o cadeado da porteira de entrada, sem a necessidade de se abrir a porta para terceiros, ou por outro meio menos
gravoso (princípio da menor onerosidade – art. 1.286, parágrafo único do CC).
Por fim, bom evidenciar que só se pode considerar aquilo que foi trazido aos autos até então, isto porque, não se pode deixar
de reconhecer que se trata de conflito com certa complexidade, de modo que mostra-se prudente, na hipótese, a manutenção
da situação fática existente antes da colocação da porta de ferro, até decisão final do Agravo, até porque não se trata de área,
a princípio, utilizada pelo proprietário.